quarta-feira, 22 de setembro de 2010

À ESPERA DO NADA

Todos os dias quando voltava para casa eu o via, estava sentado ali, no alpendre, olhos fixos no horizonte como se esperasse alguém.

Eu parava e ficava imaginando no que ele estava pensando, a quem ou que ele esperava, as vezes ousava chegar mais perto mas ele não me via, era como se eu fosse invisível a seu olhos.

Na cidade pessoas teciam vários comentários a seu respeito, diziam ser ele um homem misterioso, que trazia em sua bagagem uma história de dor e horror, outros que ele ocultava algum mal feito a alguém no passado.

Só sei que ele me despertava compaixão e curiosidade, uma manhã ao passar por lá, notei que ele me olhou de forma diferente e me deu medo e um impulso de fugir, mas que também queria ficar.

Mas foi só um momento seus olhos fixaram-se novamente no nada e sua mente se perdeu no profundo de seus pensamentos, caminhei aliviada e ao mesmo tempo frustrada com a reação daquele homem.

O calor era sufocante, meio de janeiro, o homem havia tirado meu sono, aqueles olhos ainda me olhavam através da cortina que o vento quente parecia estar com preguiça de sacudir. Caminho passos lentos, estou outra vez em frente a sua casa, arrisco e vou até a vidraça meio embaçada pela falta de cuidados.

Tive que conter o grito, ele estava sentado na sala e me olhava como se quisesse falar, tinha nas mãos um retrato e lágrimas corriam por sua face, empurrei a porta devagar, meio sem perceber o que fazia, sentada a seu lado ele mostrou noticias de um jornal de época, que contava um crime ocorrido, onde um marido sentindo-se ultrajado limpou sua honra com uma faca enfiada no coração da amada. Amedrontada achando ser ele um assassino quis fugir, mas ele me explicou que ele e sua amada tinham planejado uma fuga para aquela noite e que ela ia pedir ao marido separação, mas alguém os traiu e quando ele chegou ao local do encontro ela jazia morta.

Sem coragem de tirar sua própria vida, enterrou-se vivo e hoje fica lá sentado esperando o dia que sua amada venha lhe buscar e de sua prisão espiritual venha lhe libertar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário