sábado, 27 de novembro de 2021

Saudade

 



Esta lágrima que ora escorre

A meu peito dilacera

E a alma morre

Derradeira


É  a saudade

Que pisa, que pulsa

Parece até maldade

Me causa repulsa


Como entender os viés 

Que te levou embora

E que de volta não trás 

Grito desesperado, sonoro


Grito mudo de saudade

Rasga o peito de ansiedade 

Meu verso

Hoje é controverso 


É a saudade que pede passagem

Chegou arrancando lágrimas 

Trazendo a tona a dor escondida 

Hoje preciso beber dela

Para acalentar meu coração 


Jussara Rocha Souza

quinta-feira, 25 de novembro de 2021

Renascer

 És um pequeno jardim

Cultivado com amores enfim

Nele há pássaros, borboletas

Lilás pelas violetas


Mas nem sempre foi assim 

Foi árvore morta 

Triste assim

Galhos retorcidos, caída, torta


Um mentiroso jardineiro

Prometeu regar o ano inteiro

Cortou seus galhos

A deixou em frangalhos 


Dela restou raízes 

O bastante para renascer

Cresceu marcada de cicatrizes

Bastou para florescer


Hoje és jardim

Espalha aromas

Fragrâncias de felicidade

O jardineiro?

Atrás das grades


Enfim a liberdade

A minha é  claro...


Jussara Rocha Souza 


Dia internacional do combate a violência contra a mulher.


Crônica da crônica

 



Confesso que não ando muito inspirada a escrever, minha saúde tem me deixado meio sem palavras.

Mas lendo a crônica do amigo e cronista Geraldo Jose Costa Junior de hoje(24/11) me instigou as letras e aquele tremor nas mãos e amor pela criação me tomaram por inteira.

Meu amigo Geraldo não gosta de viver o passado e eu sou uma saudosista de carteira assinada.

Deixe-me explicar, não que eu viva em uma cadeira suspirando pelas lembranças já vividas, eu vivo o presente sim, sonho com o futuro mas amo absorver na pele e na alma as fragrâncias deliciosas das coisas boas que já vivi. É claro que também tem as ruins, inevitável em um mundo onde sempre haverá o bem e o mal, mas das ruins faço aprendizado, e deixo elas trancadas no baú do passado. Mas passeando em sua crônica me vi sentada na escola de datilografia do seu Flores em uma máquina de escrever Remington e no auge dos meus quinze anos sonhando em ser uma escritora escrevendo romances de amor intensos e com final feliz.

Os sonhos caro Geraldo, estes me são os mais caros, roubem- me tudo, menos os sonhos, sem eles estou morta, e continuo sonhando como você com a tal felicidade, quem sabe te visitar e bater um papo em um banco de praça se a morte não nos visitar antes. Pode até parecer mórbido, mas como dizia minha avó "para morrer basta estar vivo".

Mas falando em coisas boas, hoje está sol, os pássaros estão a cantar e eu acordei mais um dia e isto é dádiva, sem contar a crônica deste meu amigo que me fez voltar a querer escrever.


Jussara Rocha Souza


À você Geraldo  meu cronista e amigo, hoje sentei a seu lado para escrever.

sábado, 20 de novembro de 2021

O dia que conheci o preconceito racial




Eu não sabia o que era preconceito racial até ter quinze anos, sempre vi e vejo até hoje todos seres humanos iguais e a cor nunca me chamou a atenção como diferença. 

Chamou a atenção sim, quando me apaixonei com 15 anos por um rapaz negro, lindo, maravilhoso!

Logo ficamos encantados um pelo outro, eu queria que o mundo conhecesse meu amor, então resolvi apresentar Miguel a meus pais(este era o nome de meu amor) e para minha triste e desesperadora surpresa minha mãe fez um escândalo. O namoro foi proibido terminantemente e eu fiquei de castigo, meus pais cuidavam a entrada e saída da escola, eu queria saber o que meu namorado tinha de errado, sapatiei, chorei, espraguejei e escutei minha mãe aos berros dizer: -Ele é um negro, prefiro te ver morta dentro de um caixão do que namorando um negro.

Neste dia mesmo sem entender o porquê vi que as pessoas faziam diferença de cor entre os seres humanos, nossa história não teve um final feliz.

Meus pais me mandaram para outra cidade para esquecer Miguel, na véspera da partida me encontrei com ele e disse que teríamos que dar um tempo, mas que eu o amava muito, choramos muito abraçados e nos despedimos com um longo e apaixonado beijo.

Eram duas horas da madrugada quando bateram palmas no portão, meu pai atendeu e uma senhora com muita raiva esbravejava contra meu pai, sabia que era com Miguel, meu coração me dizia que era.

Meu amor tentou o suicídio, graças a Deus não morreu mas nunca mais foi o mesmo, os remédios que tomou afetaram seu cérebro e ele ficou doente mental. Ainda tentamos ficar juntos quando ele voltou da clínica, mas ele não era mais o mesmo e meus pais se mudaram de residência. Eu também nunca mais fui a mesma, naquela época era menina e a opressão e repressão eram intensa, vivíamos uma ditadura fora e dentro de casa, mas fiquei adulta e me prometi lutar sempre contra toda forma de preconceito. 

Hoje 45 anos depois o encontro pelas ruas da cidade, meu coração dispara e eu baixo os olhos de vergonha diante do que fizeram com ele, um amor inocente, uma vida perdida e qual foi nosso crime, termos cores diferentes.

Estes dias passei a seu lado e mesmo sabendo que ele vive em um mundo alheio ao meu por causa da sua doença senti que me reconheceu, a ignorância nos separou com seu nojento preconceito mas nunca matou o amor que carrego no peito.


Jussara Rocha Souza 


Mini conto baseado em fatos reais.


No dia da consciência negra dedico meu mini conto ao Miguel  onde estiver.

quinta-feira, 11 de novembro de 2021

Dançando com a solidão




Sentou na cama e sentiu o ar gelado da manhã. Da janela vinha o canto dos pássaros e o aroma das flores do jardim.

A vida não tinha lhe dito palavras doces, mas não lhe tirou a sensibilidade de apreciar as coisas bonitas do mundo.

Arriscou uma canção, a voz já não tão forte denotava que a idade já lhe era avançada, serviu uma xícara de café e sorveu os goles tentando absorver o máximo do prazer da bebida.

Foi até a soleira da porta, esticou o corpo e deu o rosto já repleto de vincos para o sol beijar, ficou ali recebendo o carinho dos raios de sol, faz tanto tempo que não recebe um afago de alguém. 

Fecha os olhos e lembra dos tempos de juventude, queria agarrar o mundo com as mãos, como saber o futuro, como parar os desejos, aventuras. Sorri, lembrando alguém mais especial, toca os vincos do rosto e uma lágrima lhe cai. 

Volta até o quarto, coloca uma música na velha vitrola, convida seu amor para dançar e ao som de uma antiga canção romântica rodopia pelo quarto a bailar.

E então abraçado em seus próprios braços se põe a chorar.


Jussara Rocha Souza

segunda-feira, 1 de novembro de 2021

Sobre o dia dos mortos

 Não quero ser uma foto em um porta retrato, esquecida e empoeirada sobre um móvel qualquer.  Quero continuar viva dentro de seus corações com a melhor fotografia que tivemos juntos a do nosso amor eterno.

Não quero choros, flores e nem velas em cima de uma sepultura por ser uma data que diz que você deve ir lá, neste lugar não existe nada de mim, apenas matéria que revestiu-me por quanto tempo estive aqui. Regue meu jardim mantenha minhas flores vivas, seja o mais feliz que puder e quando sentir saudades minhas, chore, lágrimas saudosas de quem amou e foi amado sem datas obrigatórias para isto.

Jussara Rocha Souza


Serei eu uma bruxa?


 Crônica 

Serei eu uma bruxa?

Meu avô materno era um mestre na arte de curar, tinha conhecimento de ervas, chás, unguentos. Este conhecimento veio do povo cigano do qual era descendente. 

Lembrando do meu avô, me veio a mente as aulas de história e o Tribunal do "santo" ofício também conhecido como Inquisição, onde pessoas foram mortas(sendo a maioria mulher) por discordar ou ter pensamentos diferentes da igreja católica. 

E foi a partir deste momento que as bruxas foram criadas como seres malévolos, com verrugas na ponta do nariz capazes de matar com seus feitiços diabólicos, colocaram terror no povo a fim de instigar uma matança em massa.

Mulheres foram queimadas vivas, vítimas das maiores atrocidades, e quem eram estas mulheres? Geralmente mulheres do povo, de condição humilde, parteiras e com auto conhecimento em ervas, pomadas, médicas formadas em medicina popular ou tão somente por ter nascido bela e resistir a nobres e padres poderosos da época. 

Foram perseguidas e caladas, tirando dos mais necessitados a chance de ter um médico, foram mortas para não passarem seus conhecimentos ao próximo.  

Agora te pergunto serei eu uma bruxa? Porque tenho um canteiro de ervas e uso como chás, porque faço pastas e unguentos?

Será que o médico da unidade de saúde que me receitou vapor de tanchagem para sinusite tem parte com demônios e deve ser queimado vivo?

Será que a bela mulher que denunciou o político abusador deve ser morta a pedradas por ser uma bruxa malévola?

É, as bruxas andam soltas, cada dia mais interessantes, inteligentes e sem medo de denunciar.

Sem medo de usar seus poderes não só nos chás e unguentos, na infinidade de profissões que se propõe a fazer.

Hoje ainda existe muito inquisidores que matam, queimam e fazem as maiores atrocidades com nós mulheres, usando as mais baixas desculpas, se é que existe alguma para continuar nos matando.

Sou descendente de um "bruxo" se assim quiserem denominar a medicina popular e como ele acredito no poder das ervas, porque se Deus as criou era para fazer o melhor uso das mesmas.

Sou cristã e isto não me impede de usa-las, se ser mulher e não aceitar uma sociedade com pensamentos medievais e intolerante então sou Bruxa com muito orgulho.


Jussara Rocha Souza