domingo, 17 de novembro de 2024

Onde você mora





Já morei em tantas casas

Em tantos lugares

Hoje resido em uma rua chamada Saudades

Em uma casa repleta de recordações 

Mas, opa! Não se assuste, aqui mora a felicidade

Ainda ouço a balbúrdia dos meninos a correr pelos cômodos 

As brigas de travesseiro 

Os ciúmes de minha atenção 

As peladas de pés no chão 

Sim, aqui mora a felicidade 

E ficou tatuada na rua Saudade

Aqui nasceram sonhos

Gente pequena querendo ser gente grande 

Para depois voltar correndo para o colo de mãe querendo ser pequeno de novo

Aqui sempre há um prato a mais na mesa

Um colchão guardado 

E a certeza de um amor bem cuidado

Construí esta casa anos a fio

Houve chuvas, temporais e nela até passou um rio

Foram anos difíceis, desafios

Mas foi tão bem alicerçada 

Que continuou em pé 

Alicerçada na fé 

Moro na rua Saudade

Casa da felicidade

Venha me visitar

Aqui transborda gentileza

E um coração aberto a alegria e tristeza

Porque a vida não é só beleza

Entre, faça morada, fique o quanto for preciso 

Depois siga sua caminhada 

Minha casa é casa de passagem 

Onde o amor é sua anfitriã 

Aqui ninguém é louco ou sã

Apenas gente

Venha, entre!


Jussara Rocha Souza

Rocha

 



Sou minha própria paz

Calmaria em meio a temporais

A água bate no rochedo 

A pedra a beija

E a devolve ao mar

Sem medo!


Jussara Rocha Souza

Pintando o céu da alma

 Vamos menina

Pinte de azul este céu 

Tire este negro véu 

A vida, ah! A vida é ampulheta

Escorre por entre os dedos

Não tenha medo

Lembra você?

Corajosa 

Audaciosa

Sorriso no rosto 

Vida vivida com gosto

Com gozo

Com sabor de quero mais

Vamos, dance comigo 

Cante, se anime

As lágrimas virão de qualquer maneira

Mas você esqueceu?

Você é carvalho

Forte madeira

E mesmo quando orvalhado

Lambe suas gotas de água 

Vire o rosto para a luz

E brilhe

Como um girassol 

Frágil, flor, mas iluminado

Mesmo em noites sem lua

No amanhecer busca o sol!


Jussara Rocha Souza


Onde estás?




Estarei sempre

Na tua memória 

Naquela história 

Em tuas vivências 

Na sua essência 

Estou contigo

Quando sentes falta de um amigo

Em noites de frio

Sou teu abrigo

No teu cansaço

Sou o abraço 

O aconchego 

Quando te faz falta o chamego

Estou em tuas lembranças 

Nos olhos repletos de esperança 

Sou chuva fina de saudade

Na vidraça da felicidade 

Somos pedaços de nós 

E por isso nunca parti

Viverei para sempre dentro de ti!


Jussara Rocha Souza

Insano




Tenho medo de minha insanidade

Esta que me liberta

Me corta arreios

E livra dos freios

É a mesma que me destrói 

Quando sou oposto

Que a sociedade constrói 

Tenho medo de não saber quem eu sou

De dançar nua na chuva

Porque um dia a vida me sufocou

Com dogmas, preconceitos

Falta de direitos

Fui tudo que me permitiram

Tudo que me proibiram 

A cabeça lutou, lutou

Enfim cansou

Hoje usa a insanidade

Para a própria liberdade

Mas ainda existe a sociedade

A falta de sensibilidade 

O deixar de produzir

De construir 

Pobre mente

Continua prisioneira 

Ontem da sociedade

Hoje da insanidade


Jussara Rocha Souza 


Eis-me aqui

Linda, louca

Tresloucada 

Pés no chão 

Corpo nu

Na loucura não preciso de vestes

Modos

Etiquetas

A música é composta por mim

Batom carmim

Danças esvoaçantes 

Não há lucidez

Mas há doçura no olhar

De alguém que se perdeu

Tentando se encontrar

A velhice me jogou

Do esquecimento 

A tortura de não saber mais quem sou

O que fui não importa mais pra ninguém 

Sou estorvo

Atrapalho

Eis-me aqui

Linda, louca

Tresloucada 

Esquecida

Em um canto qualquer 

Até chegar ao jazigo!


Jussara Rocha Souza 


( Um dia todos ficaremos velhos, que você tenha a sorte de ter mente e corpo sãos ou contar com pessoas que te amam, pois caso contrário será esquecido em um canto qualquer.)

terça-feira, 29 de outubro de 2024

Cicatrizes




Cuidado ao tocar uma mulher ferida

Ela foi mutilada 

No corpo e na alma, torturada

As cicatrizes sangram por vezes

E a casa há tanto estruturada 

Em um breve momento vem a desmoronar

O jardim de suas raízes arrancadas 

Ela não pede 

Nem ao menos percebe 

Mas as marcas estão lá 

E frágeis como pétalas de rosas

Caem ao toque do vento

Portanto tenha cuidado ao lhe tocar 

Ela não sabe mais amar

Ela não tem feridas só no corpo 

A alma também é machucada

Ela seguiu em frente porque era preciso 

Lutou com monstros interiores 

Que lhe assombram em pesadelos 

Serviu de cobertor

Para que outros não sentissem o frio de sua alma nua 

Não a machuque

Ela vestiu-se de coragem 

Podou as ramagens

Tapou as cicatrizes

Perfumou com folhas de anis

Mas não se engane

A dor ainda vive ali!


Jussara Rocha Souza

Utopia




Coloquei no mar

Meu barco de papel a navegar

Deixei ele a vagar

Por noites escuras a velejar

Nele carregava meu pranto 

Um triste canto 

De uma menina de cabelos brancos

Que deixou naquele banco

Um jovem senhor

Motivo deste amor

E como o barquinho de papel 

Navegou para um mar de estrelas

Lá bem longe, ao infinito 

E nunca mais voltou

Em noites estreladas

Volto meus olhos aos céus 

E busco teus olhos a me espreitar

Minha alma então pranteia

Te parece utopia 

Para mim é fantasia

Que minha alma permeia.


Jussara Rocha Souza

O dia acordou saudade




O dia acordou saudade

Aquela que aperta, dói e assim mesmo trás felicidade

Saudades do meu amor

Saudades do que se foi e do que ficou

Saudades do que não fizemos

Da vontade dividida

Do amor proibido 

Que um dia no passado havíamos vivido

O dia acordou saudade

Batendo forte na porta do coração 

Sabendo que não irás voltar

Que vives no infinito, na imensidão 

Hoje é só eu e a saudade

Te encontro no rosto de outras pessoas nas ruas da cidade

Na canção que ouço no rádio 

No casal apaixonado na novela

Hoje o dia acordou saudade

E as lágrimas teimam em não querer parar

És fruto de minha dor

Da minha triste existência 

Do amor que serviu de experiência 

Para que eu saiba que nosso amor era para a eternidade!


Jussara Rocha Souza

Elegia




Silêncio seu moço 

Que a vida está osso

O amor vai morrendo 

Os sentidos empobrecendo


Tudo parece normal

O cruel é banal

Eu não me conformo 

E então morro


Morrerei de qualquer maneira

Sem eira ou nem beira

De fome, amor ou educação 

 As mãos amarradas da corrupção 


Silêncio seu moço 

Falar é corda no pescoço 

Foi suicídio diz o jornal

Suicidou-se com as mãos do Sr mal


Hoje se morre todos os dias

Sangue, celular e fotografia 

Celebrando a elegia

Morre o poeta e a poesia!


Jussara Rocha Souza

Não fui preparada para a morte

 Não fui preparada para a morte



Eis-me aqui

A ferida aberta

Da noite escura

De terrores descoberta


Eis-me aqui

Ferida cicatrizada

Nunca esquecida

De dores supurada


São versos doídos 

Do medo construído 

Da dor da impunidade

De quem bate e é absolvido 


Sou náufrago 

Resgatado do mais profundo oceano

De águas escuras e lamacenta

Que extinguiram minha essência 


Fui então presa

De abominável criatura

Matou a vida, doente

Roubou minha doçura 


Me dizem para esquecer

Como? se a ferida sangra

E o sangue ainda sinto escorrer

Desculpe, se não quero ser forte


Não fui preparada para a morte!


Jussara Rocha Souza

Jardim da alma




Entrei com passos silenciosos 

A casa parecia vazia

Havia pequenos rasgos

Algo lá dentro ainda feria


Cuidei para não machucar

Mas confesso havia intenção 

Não queria te assustar

Apenas ganhar teu coração 


O temporal tinha feito estragos

Agora qualquer tempo é tempestade 

A dor sorvida aos tragos

Causou deformidades


Passos meticulosos 

Um olhar doce

A vida querendo gozo

Talvez ainda precoce


Então fui embora de mim

Quem sabe em outra primavera 

Talvez esta dor tenha fim

O passado seja quimera 


Retiro-me

Passos silenciosos 

Devolvo meu ser a mim

Já posso cuidar de meu jardim!


Jussara Rocha Souza

Será a chuva?




Estas paredes lilases

Testemunha de risos e amores

Em um cômodo vazio

Corre o tempo

Lento como um rio

Móveis imaginários 

Feitos em desenhos de giz 

Em paredes segregadas

Batia um coração feliz

As violetas na janela

Espiavam os moleques na calçada 

Bola, amarelinha, pedras nas vidraças 

Um olhar furtivo

Amores inocentes

Balas de anis

No sótão gemem os amantes

Minha musa

Que se despe de virtudes

Lhe tiro a blusa

Entre tintas e pincéis 

Barriga vazia

E a melodia!


La Boheme.... Lá, lá, lá...


Jussara Rocha Souza

Solidão de sentimentos

 



Vivia só 

Não a solidão de um ser sozinho

Era a solidão de sentimentos 

Daqueles que se perdem com o tempo

Como no temporal em busca de abrigo

Na casa destelhada 

Fingindo estar acolhida 

Se sentia vazia

Triste

E a cada dor algo se desfazia dentro de si

Então compensou a solidão 

Com arrumação 

Arrumava casa noite e dia

Mas depois viu que esta não arrumava coisas do coração 

Então para cada dor, ela de objetos se desfazia

Até que a casa então ficou vazia.


Jussara Rocha Souza

quinta-feira, 12 de setembro de 2024

Saudades é conversa animada

 



Queria que estivesses aqui

Com este sorriso bobo de guri

Quero te contar que ainda resisto 

A luta é brava, mas insisto


Hoje tocou a nossa música 

Dancei de forma lúdica 

Enlaçada no porta retrato 

Deslizei em teus braços 


Saudades é conversa animada

Entre a ausência, você e o passado

Entremeios choros e recordações 

Um turbilhão de sensações 


É chuva que não cessa

O amor que não mais regressa

É você que não vai mais voltar

É a saudade a me acompanhar 


O coração resiste

Mesmo sendo triste

Venha vamos dançar 

Enquanto houver música e poesia

Não haverá morte e nem dor 

Só a lembrança deste nosso amor


Jussara Rocha Souza

Paz

 Acrílico sobre madeira 


Deserto

 Acrílico sobre madeira 


Sozinha




Eu vivo a solidão dos ausentes

Daqueles que tudo sentem 

Do amor não realizado

Da canção inacabada


A solidão da rua deserta

Do beijo na hora incerta

Das vontades reprimidas

Das dores tão sofridas


A solidão das noites insones

Dos bares, amigos anônimos 

Do choro e o riso

Do desequilíbrio convulsivo


Eu vivo a minha solidão 

Do interior de meu coração 

Repletos de segredos guardados

Escritos em tristes versos


A solidão das mariposas

A mesma de muitas esposas

É um só na solidão 

É a solidão em meio a multidão 


A noite se despede

A lua então adormece

A solidão me abraça 

E o olhar embaça 


Então começa um novo dia!


Jussara Rocha Souza

Almoço de domingo (drama)



Era um domingo como todos os outros, levantou no horário habitual, fez a higiene, tomou o café e foi para a lida doméstica.

Ia tirar o pijama antes, mas pensou: não vem ninguém estranho aqui mesmo e prosseguiu.

Colocou roupa no varal, fez o almoço e sentada a beira da mesa no seu tradicional almoço de domingo, começou a rir alto, cada vez mais alto.

Um silêncio sepulcral se fez, os filhos que riam, bebiam, comiam e falavam entre si, calaram.

O marido sempre compenetrado em suas conversas sobre carros e outras modalidades esportivas, branco como papel olhava para a mulher fora de si.

Ela levantou e de repente perguntou? Alguém vai querer sobremesa? Todos responderam que sim e a balbúrdia voltara em volta da mesa.

A mulher então levantou, caminhou até o meio da cozinha, enfiou a mão no bolso do avental, tirou uma arma e deu um tiro na cabeça!


Jussara Rocha Souza

sábado, 31 de agosto de 2024

Me recuso a matar o amor




Mataste o amor?

As ilusões e dores?

Pois saiba

Que eu me recuso a matar as ilusões, romances e almas gêmeas 

Pois há no amor um encantamento 

E mesmo quando dói é sentimento

Eu me recuso a deixar de sentir

Quero continuar a sonhar

Embevecida ver o nascer do sol

As flores no arrebol

E as estrelas no céu a brilhar

Quero amar 

E quem sabe neste sonhar

Não tenha uns olhos a me observar!


Jussara Rocha Souza

Olhos d'água

 



Ela tinha os olhos d'água 

Carregados de emoção 

Molhados de lutas

Agora tréguas 

Somente gratidão 

De tanta abundância 

Sofreram inundação!


Jussara Rocha Souza

segunda-feira, 19 de agosto de 2024

Tempestade na alma




São temporais

Estações do ano

São seus ais

Como trovões retumbando


É o cotidiano 

Pessoas correndo

Entra e sai ano

Até esquecem que são humanos 


Ela dizia que sentia

Ninguém a ouvia

Em silêncio gemia

Passava noite e dia


Cultivava flores

No coração dores

O jardim colorido

A alma sucumbindo 


Até que silenciou

No jardim tombou

Seu corpo como flor 

A terra tomou


 Sua alma finalmente se libertou!


Jussara Rocha Souza 


Nota do autor: Não deixe que o outro fique invisível, o amanhã pode não existir.

Preste atenção aos sinais, o mundo está doente e precisa de socorro.

Faça você a diferença, não podemos salvar o mundo, mas podemos salvar nosso próximo, porque um dia, você pode ser o próximo.

Saudades de uma velha menina




Quando o céu se fecha

E a tormenta brava

Ao longe arrebenta 

As lágrimas aos olhos se achega


São minhas memórias 


Lembranças das histórias 

Contadas ao pé da mesa

Sentada ouvia, encantada

Com a fala de meu velho pai


Nesta hora a chuva cai


Um homem de fibra

Enverga, machuca e cicatriza

Moldado sobre a brasa do ferro

No corpo as marcas da lida


Dói no coração desta menina


O trabalho e as necessidades 

Fez deste homem a hombridade 

Apesar da dureza nos traços expressos

Deus lhe deu coração de menino


Acalentando seu destino 


Da janela me aprochego

O vejo na vidraça embaçada 

Sorrindo a cantarolar

A música de minhas lembranças 


E então choro como criança!


Jussara Rocha Souza 


" Sertaneja se eu pudesse

Se papai do céu me desse

O espaço pra voar

Eu corria a natureza

Acabava com a tristeza

Só pra não te ver chorar"


Música que meu pai cantava para mim.

Vidraça da alma

 Havia dias em que  lágrimas embaçaram a vidraça da alma!

Mas vendo o sol lamber o orvalho das folhas me vesti de calor humano e deixei as vidraças a brilhar!


Jussara Rocha Souza


Encontro




E o tempo foi passando

As águas no rio rolando

O trem nos trilhos a passar

E eu aqui a te esperar 


Era tarde de verão 

Passou estação e estação 

Vi flores a desabrochar 

E do mesmo jeito murchar


Meus cabelos branquearam

Tal geada nevam

O rosto viçoso 

Hoje já sulcoso 


E o tempo então passou

O rio secou

Os trilhos desativados

Meus olhos orvalhados


Sentada na varanda 

O xale caído as ancas

Avisto a ponte

Alguém ao longe


Fechos olhos

A lágrima escorre

Finalmente

Te encontro!


Jussara Rocha Souza

sábado, 20 de julho de 2024

A máquina de costurar sonhos.



O som da máquina de costurar de minha mãe ainda o ouço em meus ouvidos, ele me segue, vem costurando o tempo, rasgado pelas vivências.

A máquina ficava na varanda onde eu dormia em uma cama de armar, no escuro eu ficava imaginando a máquina funcionar e as histórias das peças de roupas que minha mãe costurava.

Certas lembranças ficam na mente das crianças, umas alegres, outras nem tanto. Na minha, ficou o barulho da máquina a preencher o vazio de uma infância vazia, trabalhei desde os onze anos de idade.

Morávamos em um chalé verde-claro com alpendre na frente, havia um banco no qual meu pai passou várias noites após chegar tarde em casa e minha mãe o proibiu de entrar. Depois de um tempo de sono no banco, a mãe o perdoava e eu o via de minha cama passar pé por pé para o seu quarto.

Meu pai, homem honesto, trabalhador, um sonhador diante de uma realidade dura, um romântico forjado a ferro e fogo, casado com a pedra a qual ele tentou forjar uma vida inteira.

Com ele aprendi o valor de um caráter, da palavra dada e da realidade dos amores que não podem ser vividos, apenas guardados no coração. No qual repudio.

Às vezes me ocorre que minha mãe costurou o coração de meu pai naquela máquina de costura, deixando-o preso em pontos cruzes em algum retalho.

Eles eram como o feijão e o sonho, ainda caminho em noites escuras por dentro do chalé, conheço cada peça, lembro do meu irmão mais velho e seus telefones, fax, rádios, meu irmão era o Professor Pardal(um inventor) juntavam-se ele e meus primos a inventar peças novas, consumir uma erva que minha mãe dizia ser incenso queimando(afinal o menino gostava do espiritual, de meditar) Saudades daquele tempo, éramos cópias dos manos mais velhos, eu era a segunda mais velha, escutávamos suas músicas, cantores, filmes para ser grande como eles.

Éramos seis irmãos, vivendo uma quase ditadura embalados por sonhos inacabados de meu pai que conhecia quando ele bebia, uma mãe dura, fria que talvez tenha sucumbido por não ser parte nos sonhos de meu pai. Ela devia sofrer muito e acabou por endurecer.

Lembro de um dia em que meu pai foi me bater, eu tinha realmente tirado ele muito fora do sério, tirou a cinta das bermudas e então ela desceu até os joelhos. Então, ele, furioso com as calças na mão, teve que sair do quarto e eu caí na risada. Eu apanhei muito, umas merecidas, outras não, nunca me acostumei a costurar sonhos, mas hoje entendo ele, e meu pai fez de mim uma poeta, com o coração carregado de emoções, sentimentos e sonhos. Lembro de um almoço em que todos comiam silenciosos, eu sentei ao lado de meu pai e falei _ Ele vai voltar! Levei um tapa no rosto que tirou sangue de minha boca, saí da mesa sem almoço e com um sorriso no rosto..

Eu fui uma revolucionária em uma casa de pais ditadores, fugi quatro vezes de casa, dormi muitas vezes sem comer, fui posta para fora com minha cama e pertences no meio da rua, mas fui eu, eles precisavam fazer de mim uma delas e isso eu não queria. Mas sabe, em certas coisas eles tinham razão, mas não me arrependo de nada, quem morou na mesma rua que eu, sabe que deixei meu nome marcado naquele lugar.

Uma jovem repleta de ideias, alegria e diabruras, o mundo era pequeno e os meus sonhos, minha mãe não conseguiu costurar, ainda os alinhavo, mas fechar costura não é comigo.


Jussara Rocha Souza.

quarta-feira, 10 de julho de 2024

Ora (direis) ouvir estrelas! Certo, Perdeste o senso!" (Olavo Bilac)



Era ainda madrugada 

O sol  dormia

Um tapete estrelado

Me convidava para mais um dia


"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo,

Perdeste o senso!" 

Bilac estava certo

Desfruto deste concerto

E ouço este belo espetáculo 


Insano, com elas então converso 


De minha frágil essência 

Perfume feito de inocência 

Com estrelas a lhe falar

Sobre a beleza de amar


Você fala em ignorância 

Eu falo de alma de criança 


A luz a noite recolhe

O sol agora desperta

Dou uma última olhada ao céu 

E na estrela que minha alma liberta


Ora (direis) ouvir estrelas! Certo,

Perdeste o senso!" 


Jussara Rocha Souza

O tio galã de novelas fez a curva na estrada (crônica)




Eu tinha uns oito nove anos quando o tio chegou para morar conosco, ia trabalhar no posto de gasolina que meu pai( seu irmão)trabalhava.

Tinha vindo do Povo Novo para Canoas onde morávamos tentar a vida, fiquei encantada com ele, um castelhano alto, bonito e com uns olhos maravilhosos.

Na minha inocência de menina pensava que um dia iria casar com alguém assim, ele no início era meio fechado mas depois era o xodó da casa, brincava conosco, era muito amigo de minha mãe e admirava meu pai como se fosse o dele.

Um dia ele apareceu lá em casa dizendo ter conseguido outro trabalho e que iria embora morar sozinho, nossa aquilo quebrou meu coração de criança, nem despedi dele, fiquei com muita raiva.

Depois de um tempo ele foi nos visitar, a raiva já passada corri para o colo dele, então ele apresentou a noiva( tia Nilce) eu odiei ela, dizia que era muito feia( ela era linda) e fui muito mal educada, o pai envergonhado me botou de castigo.

Então eles casaram e foram morar em Porto Alegre, viemos embora para Rio Grande e demorei a ver ele de novo.

Então adulta precisei me tratar no hospital das clínicas e fui ficar na casa de meus tios, e um deles era meu amado tio Zé, tenho lembranças do sorriso dele, das brincadeiras, um castelhano bravo e namorador.

Amante de um bom churrasco, música, amava Shana Muller e tudo de bom que a vida lhe reservava.

Hoje ele foi morar com Deus, junto de meu pai e seus irmãos ( tio Wolme, seu irmão, meu tio faleceu semana passada) devem estar contando causos, furiosos que o Uruguai perdeu, vó Lila acarinhando cada um deles e meu pai feliz em ver toda família reunida.

Quando ficamos mais velhos vimos partir tios, pais, irmãos e isto dói, mas me sinto tranquila que fui parte da história de cada um deles.

Vó Lila não conheci, meu vô João morou em nossa casa e brigávamos como cão e gato, tio Lenir levava sempre uma goiabada, um café ou um pote de doce de pêssego em suas visitas( era o rei da paciência) tio Wolme fez papel de pai em minha vida, mediou situações comigo e tio Zé foi o tio galã de novelas.

São tantas lembranças que passaria a noite escrevendo, toca uma gauchesca que hoje quero bailar para me despedir do meu tio Jose Adir Rocha Rocha


Acrílico sobre madeira 


Bailarina 


Artista: Jussara Rocha Souza

Bom dia com café (crônica)




Quatro horas da manhã estou na cozinha fazendo um café, sento na cama, um frio imenso, começo a ver as notícias do final de semana.

Então me perco em lembranças e imagens guardadas em meu cérebro e coração, você sabia que o cérebro é responsável por sentimentos e não o coração?

Mas seguindo minha conversa comigo mesma lembro um tempo agora já distante, uma casa cheia, risos, choros, crianças brincando, brigando, estudando, eram sete filhos, sete seres diferentes, amados, muito amados.

Sinto falta destes dias, eram tantas refeições, tantas roupas para lavar, levar a escola, cozinhar, mas como eu amava tudo isso, hoje restou o silêncio na casa, mas também a satisfação do dever cumprido.

Nunca os perco de vista e nem eles a mim, e ainda vejo neles minhas meninas e meninos, é muito bom ser mãe de todos, se me perguntares se deram trabalho, sim, muito, mas hoje digo com certeza amo tudo que vivemos. Lembro as bolas feitas de meia, o aquário quebrado, os amigos, o colchão passado pelo muro, o choro na hora de estudar, a franja cortada das meninas umas pelas outras, a sombrancelha raspada, aqui sozinha dou risadas destas lembranças.

Não fique triste porque seus filhos foram embora, você os ensinou a voar, cure suas asas quebradas quando eles precisarem mas deixe que aprendam com as quedas.

Cuide de si, aproveite seu tempo agora permitido, dance, viaje, vá ao cinema, namore se assim o quiser.

Você será sempre mãe deles onde estiver, mas não esqueça que você já cumpriu seu papel, agora desfrute daquilo que você conquistou.

Aqui sempre almoçamos ou tomamos café juntos em algum dia da semana, o chimarrão pela tarde na frente de casa é prioridade, nos falamos no celular, ainda há os puxões de orelha, fizemos chamada de vídeo, damos boas risadas, brigamos e no fim a paz volta a reinar.

Somos muitos e nossa casa vivia cheia de nós, filhos de coração e quem mais chegasse, hoje vejo como ajudei muitos a trilhar seus caminhos e que honra ser mãe de todos.

Nunca serei só, pois quem semeia amor produz frutos frescos e de qualidade e minha horta brota mais e mais a cada dia!


Jussara Rocha Souza

Cabideiro (crônica)




Hoje me despi, irei ficar nua, não quero mais ser cabideiro de mim ou de ninguém.

Você também tem se sentindo assim? Então resolva isto logo, eu passei a vida inteira sendo cabide para problemas e situações que não eram minhas.

Carreguei tantas coisas materiais, espirituais, que minhas costas envergara, minhas mãos estão repletas de artrose e uma dor no íntimo que acaba com meus sonhos e alegrias.

E a culpa é de quem? Minha, que permito que me usem, que deixo o coração falar mais alto que a razão, que achei que me doar era sempre pouco, que eu não era o suficiente para as pessoas. E aconteceu que diante de um cabideiro vazio começaram a colocar suas roupas, primeiro vieram as pequenas, era um cachecol, depois foram calças, casacos e quando me dei contas haviam várias pessoas dependuradas no meu cabide, o peso era tanto que começou a dobrar.

Hoje me despi, compreendi que não sou responsável pelos erros ou atos do meu próximo, que o amor é uma via de mão dupla.

Que por mais amor que tu dediques a alguém tem que saber que és humana, carne, sangue, com dores e sentimentos também, que não poder carregar o mundo nas costas não podes te culpar por isso.

Não quero ser cabideiro, quero ser amigo, abrigo, mas nunca mais responsável pelos atos dos outros.

Hoje só, nua, vi que nada era meu, só as dores tuas que deixaram meu corpo repleto de cicatrizes.


Jussara Rocha Souza

quarta-feira, 3 de julho de 2024

Quero morrer embriagado de poesia

 



É Charles, é preciso embriagar-se, em ousei me embriagar de poesias.

Mesmo essas feitas de nostalgia, de saudades e noites vazias... Amo o privilégio de beber versos quentes, dolentes, embriagar-me de sonhos e paixões.

Quando me visto de outra e nas páginas de um caderno resido em perfumados colchões, sim, me embriago de poesia , pois ela habita em mim, tresloucada, meiga,educada, ousada, depravada.

É suave este bebericar, quando a rima, a prosa vem em meu íntimo me chamar, quando de dor arranca meu coração e as transforma em versos e canção.

É Charles, é preciso embriagar-se, hoje bebo esta prosa com dor, mas uma dor gostosa, do gozo da poetisa, que com rimas ameniza as crueldades desta vida.

Hoje embriago-me sem perdão, para que não sinta do tempo esta ação, digo a mesma, é só mais uma estação, vai passar como o vento no temporal, como este verdejar atemporal, como a  noite cede o dia, como eu dou vida a poesia!

Embriago-me de poesia, e deixo ela falar por mim, porque nem sempre serei noite, nem sempre serei dia, e se for para morrer que seja embriagado de poesia!


Jussara Rocha Souza 


Em alusão ao poema de Charles Baudelaire!

Anáguas




Há um que de saudade em mim,

Saudades não sei do que...

Talvez sejam os dias frios,

Talvez seja o barulho do rio...


Só sei que é saudade,

Coisas da tal idade...

O barulho da água me faz lembrar,

Memórias a recordar...


Pessoas vão e vem,

E eu as observo atrás da linha do trem...

Estes trilhos carregam vivências

Estas águas inocência 


A janela aberta

Um coração a espreitar 

O apito do trem

A chegada de alguém 


Há um que de saudades

Saudades dos amores gris

Do amor escrito em giz

Nos muros da cidade


Talvez seja o barulho do trem 

Esperando chegar alguém 

Talvez seja o cantar das águas

Molhando minhas anáguas!

Menina flor

 Acrílico sobre madeira 

Artista: Jussara Rocha Souza 


Retalhos de saudade.

 Prosa



Escuto o barulho da chuva e lembro dos tempos de criança.

Eu e meus irmãos dançando a dança da chuva no pátio de casa, brincando, brigando, dando risadas, chorando, uma família sem saber que éramos uma família.

Lembro os ditos populares de minha mãe que sem querer levamos para a vida toda como:

Jogar sabão no telhado para Santa Clara lavar a roupa de menino Jesus. Cruz de sal para abrandar a tempestade.

Tapar espelhos e por aí vai, são memórias que a chuva me trás, hoje queria nós todos juntos, inocentes,  apenas crianças sem maldades ou coerência, apenas crianças!

O tempo vai nos levando embora aos poucos, a vida e seus cursos nos afasta, assim é, assim foi preciso. Hoje me deu saudade de ser criança, tomar banho de chuva, brincar nas poças de água e os pés embarar


.

Senti saudades até das surras e broncas de meus pais, porque eles estavam lá, hoje já  sendo idosa vejo que o tempo está escorrendo por entre meus dedos, ficamos chorões e as saudades começam a nos visitar.

Lembro o pai na beira da mesa a contar causos quando faltava luz, a mãe cantando e o pai acompanhando na caixinha de fósforo.

A chuva tem este dom, trazer saudades no peito, ficarmos melancólicos e querer voltar o tempo, hoje quis ser criança e na minha inocência nunca deixar de ser, lembrar do gosto da casa dos pais, o fogão a lenha, o cheiro da casa da vó, a amizade com os primos, o dormir na casa dos tios, estes que muito me socorreram das minhas artes e várias fugas de casa.

E então nesta noite de muita chuva e tormentas, me enrolei em minha colcha de retalhos de lembranças e fui dormir com a saudade.

Jussara Rocha Souza 

Pensamentos

 Quando me encontrares, olhe-me com os olhos da alma.

É estes que me interessam!


quinta-feira, 27 de junho de 2024

segunda-feira, 24 de junho de 2024

Esquina da Misericórdia


 


Esta tristeza no olhar

Vazante de um rio correndo para o mar

Foi ali na esquina da Misericórdia 

Diante de tua covardia


Que ela o viu partir 

O cargueiro no horizonte a sumir

Então escondida

De ti tão sofrida 


Agarrada na pilastra 

Chorando a vida madrasta

De bucho cheio

E o pai no estrangeiro 


A noite no cais

Bebe, para esquecer os ais

A vida precisa ser feita

O 'mal' desfeito


Engole o tal amargo 

Revirando o âmago 

O sangue brota revindicando 

A vida a terra misturando


Lança um último olhar ao mar

As lágrimas a brotar

Foi melhor assim

Diz para si a infeliz


Arregaça a saia

Deixa que a coxa sobressaia

A esquina a espera

Engole o choro e com sangue a vida tempera!


Jussara Rocha Souza

Ser de luz

 Poema em homenagem a minha prima Tânia Rocha.





Olha o trem 

Ele todos dias passa por aqui

Trás velhos e novos passageiros 

São eles mensageiros 


Vem trazer conhecimento 

Descobrimento 

Consolo aos oprimidos

Vida aos desiludidos 


Talvez você não saiba

Mas  fostes capacitada

Para estar no trem

E ser mensageira do bem


A bagagem por vezes pesa 

Mas o coração suporta com leveza 

Porque és ser de luz

E a tua mão é Deus quem conduz!


Com amor da prima irmã Jussara Rocha Souza

segunda-feira, 17 de junho de 2024

Viagem




Quando despertas 

Em mim despertas vida

Esta por vezes alegre

Outras doridos


São fragmentos 

Pedras de assento 

Neste trem em movimento 

Desde o nascimento 


Mas tu a mim tocaste

Com notas suaves

Aquelas a quais cantasse 

Canções inimagináveis 


Frutos do espírito 

Aqui vim fazer a viagem 

Deixo para o infinito 

Minha vaga passagem 


Pra você meu querido amigo Paulo!


Jussara Rocha Souza

Almas desnudas

 



A noite escura me entristece 

Saio a sua procura

Te encontro em meus devaneios

 

Nos beijos que não dei

Em desejos que não saciei


Olho ao longe 

Onde será que se esconde

Embora saiba a resposta 


No outro lado da cidade 

É lá que mora minha insanidade 

Lá o amor tem gosto de felicidade 


Gosto de fruta madura

De algodão doce

Hum!!! Que doçura 


Do outro lado da cidade

Reside meus pensamentos 

Também mora lá meus sentimentos 


Em um jardim de flores miúdas 

Paixões graúdas

E almas desnudas!


Jussara Rocha Souza

Bilhete




Comprei um Martini, separei duas taças, estou esperando você.

Arrumei um vaso bem bonito de flores, todas muito coloridas e lindas.

Quando chegares escolhes a música, hoje quero dançar contigo.

Vou esperar tua resposta, você vem?


BEIJOS AMOR 'MEU"


Jussara Rocha Souza

sexta-feira, 14 de junho de 2024

Enchente


 Ser poeta, não precisa ter rosto ou corpo...

Ser poeta é ter alma, essência!


O mar e os seus segredos, mistérios 

Carrega dores, amores, histórias a contar

Respeite o mar, ele tudo pode

Nós somos apenas náufragos a vagar

Nestes dias de enchentes no nosso Estado, o mar não cantava canções de ninar, ou embalava casais de namorados.

Ele vinha destruidor, trazia dor e luto!


Eu amo o mar e as suas belezas, mas tenho temor também!

Pensem bem antes de agredirem a natureza, ela tem sentimentos e já deu prova disto!

Estrangeiro




Notícias nos jornais

Páginas diarias

Um café quente

E você na mente 


Corro até o ponto de ônibus 


Talvez em um cruzamento (Ipiranga com São João)

Por um momento

Eu esbarre em você 

Fingindo que nem te vejo


Por dentro sorrio

Como sorri o rio

Fugindo mansamente 

Em direção ao poente


Devaneios de um estrangeiro 


Perdido nesta cidade

Sem rosto ou identidade

Um dia eu vou voltar

E no meu Guaíba vou navegar


E no meu vôo cantar

Uma canção do Humberto 

Me lambuzar de saudade

Desta minha mocidade!


Jussara Rocha Souza

Nas bandas de lá




Eu gosto de flores

Cores e amores

Gosto de olhos nos olhos

Mas diante de ti me recolho


É que és meu segredo

O príncipe do meu enredo 

O amante mais sedutor

De meus delírios de amor


Vives preso em minha memória 

Parte de minha estória 

Contada ao pé do ouvido

Por um anjo atrevido


Meu amor mora nas bandas de lá 

Do outro lado do mar

Me canta poesias

Me encanta com melodias


Vive em minha solidão 

Dentro de um álbum de recordação 

Com fotos amareladas 

E declarações apaixonadas!


Meu amor mora na eternidade

E eu sou namorada da saudade


Jussara Rocha Souza

Crônica do entardecer

 A idade e o direito de ser quem você quiser ser(crônica)


Estou envelhecendo, e daí? Nem todos envelhecem, não diga também que envelhecer é maravilhoso, pelo lado de estar viva, sim, mas há condições muito triste na velhice.

Escolher viver bem quando se fica idoso nem sempre é possível, seja por problemas de saúde, financeiros ou mentais. Mas enquanto eles não chegam o melhor é prevenir, buscar viver da melhor maneira possível a idade.

A velhice é assunto complicado, controverso e tem muito de ilusões, pode-se ser feliz na velhice? Sim e deve, mas falar é fácil e cada um sabe onde o calo aperta. A idade e seus desafios e a vida por um fio, uns encaram como calma para outros é trauma!

Uns falam: _ Está colhendo os frutos da juventude, ou então, não se cuidou, foi ruim, não foi bom filho ou bons pais e por aí vai...

Cada um com suas estórias, suas dores e viveres, eu por aqui continuo colhendo, plantando e tentando arrumar um jeito de viver " a melhor idade" da melhor forma possível.

Tenha fé, mantenha-se ativo nos afazeres e na mente, sonhe, dance, não tenha medo da morte ela sobrevém a todos, não seja velho resmungão ou maçante, ninguém tem culpa da tua idade, ele também terá um dia e tomara lembrar você como um idoso jovem muito 'louco!'

O corpo envelhece a alma não, estes dias vi Flávia Alessandra falando sobre a idade e faço uso das palavras dela.

" Faço como Dorian Gray em seu livro O retrato de Dorian Gray, deixo meu rosto envelhecer no espelho do porão"

Eu por aqui, deixo a alma transparecer e continuo bela e feliz!


Jussara Rocha Souza


Seres encantados

 Dizem que poetas não morrem eles se tornam seres encantados


Quando eu morrer, e espero que demore, quero sim ser um ser encantado.

Quero carregar lampiões pelas noites escuras, iluminar aqueles que vivem na escuridão.

E como um ser encantado poder encantar a vida daqueles que sofrem, por abusos, fome, miséria de amor e de recursos. Levar paz onde existe guerra, flores no deserto e renascer aos que morreram mesmo estando vivos. Utopia, sim, mas é o que desejo.

Quero fazer tantas coisas, puder executar minha poesia em atos, iluminar o mundo, ditar aos amantes palavras de amor ao seu ouvido, quero levar o amor, ilusões, paixões e muita fé.

Humanizar os homens, mostrar que há esperança, tento fazê-lo diariamente em minhas escritas, mas não sou ouvida.

Quando eu morrer e virar um ser encantado quero encantar o mundo, será que seres encantados plantam flores? Se plantarem, vou colorir ruas, cidades com muitas flores, irei rabiscar muros com frases de amor e pinturas alegres. O vento cantará canções em forma de poesia, o orvalho será lágrimas de um poeta solitário e a chuva irá brotar minhas sementes trazendo cor ao cinza deste mundo!

E quanto a você ao abrir sua casa e tiver desabrochando uma nova flor ou ver uma frase escrita em seu banco de jardim, então saberás: aqui passou um poeta encantado!


Jussara Rocha Souza


terça-feira, 4 de junho de 2024

Solilóquio

 



Penso em

 mim

penso em Virginia

Desde a madrugada

até o dia


dizem que somos loucas

mas como nós são poucas

temos ânsia deste viver

tanto como morrer


meus pensamentos 

estes mais íntimo 

guardados, ressentidos

exponho nas linhas escritas(em pilhas de papéis rasgados)


tenho acordado a madrugada 

de nada tenho me alimentado(alimento-me de angústias)

vejo no dia que amanhece 

a noite que me persegue (fantasmas, vozes falam comigo)


sou tão fraca 

todos pensam que sou forte

não vejo um norte

tenho medo da noite(do escuro, das sombras)


Estas me amedrontam 


tenho medo de mim

de meus sentimentos 

de meus pensamentos 

tenho medo do que sou(aliás sempre tive)


Quem é verdadeiramente sincero

polido, com esmero(mentirosos)

guardam crueldades(dentro de si)

donos da vida e morte( julgadores)


Virginia me intriga

instiga

rouba minha loucura

não sei se depois dela

terei cura!


Jussara Rocha Souza

domingo, 2 de junho de 2024

Rua da Praia




Quando desço a ladeira

Lembro do pé de videira

Das uvas roubadas

Das calças desbotadas


O perfume do manacá

A  blusa desabotoada

O brinco na gola enroscada

O desejo e a emboscada 


Bebo o amargo gosto 

Do gosto daquele dia

A fina meia

Que rápida descia


Não sabia da cilada

Que tua boca oferecia

Do vivo batom carmim

Do sangue que ora escorre em mim


São fatos 

Em pasta esquecida 

Fotografia amarelada

Nas folhas do Pasquim 


Ladeira esquina da Praia

Teu sangue manchou minha saia!


Jussara Rocha Souza

sábado, 1 de junho de 2024

Aquilo que guardo em mim

 



Um dia talvez eu volte 

conto só com a sorte 

ao longe a plantação de trigo

aqui o som dos trilhos


não prometi voltar

pois não a quero a esperar 

talvez volte um corpo

talvez nem corpo tenha o morto


levo a imagem dela

cabelos revoltos na janela

a mala não foi feita

bagagem só da alma desfeita


na memória a canção (alucinação)

amor feito com necessidade e loucura

com gosto de despedida 

sem rosto, promessa ou vida


coloco o disco na vitrola(que canta minha revolta)

o fumo, os dedos enrola

na fumaça vejo teu rosto 

que sorvo com rosto 


ainda te espero 

ainda te quero 

na rua da Consolação 

ficou perdido meu coração


Preparo um gim

E bebo tudo aquilo que guardo em mim!


Jussara Rocha Souza

quarta-feira, 29 de maio de 2024

Noites prateadas

 



Meus cabelos prateados 

Dos dias aqui caminhado

Frutos de um céu estrelado

Em minha alma cultivado


Quando tudo se fez escuro

A vida bateu duro

Minhas noites prateadas

Iluminaram minha estrada


O corpo então dorido

Com pés e mãos ferido

A alma entoa suaves canções 

Acalmando os corações 


Olho-me ao espelho

O gris de meu cabelo

Marcas do tempo

Que cultivo a contento 


As águas talvez voltem

O pranto também 

Mas a fé se mantém 


Sou tão grata

Por minhas noites prateadas

Foi elas que iluminaram meu barco

Pelas águas congeladas!


Jussara Rocha Souza